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Mulheres do rap alertam contra machismo no gênero musical

“Mesmo com a evolução, as músicas continuam machistas, a diferença é que agora a gente tem se questionado mais. Estamos criticando e se preocupando com um conteúdo poético de uma música”, afirma a rapper brasiliense Thabata Lorena, 29 anos. “Não cabe às mulheres mudarem a história do machismo, cabe a elas se firmarem na sociedade”.


O machismo por permear no cotidiano, gera medo e insegurança entre as mulheres, segundo o antropólogo Carlos Potiara. “Esse tipo de música não ajuda, só acrescenta o medo (...) as roupas, por exemplo, não devem ser empecilho. As mulheres são livres para fazerem o que quiserem e devem ser respeitadas”.

A rapper Thabata Lorena acredita que há registros de machismo no rap mais antigos, como a canção do Gabriel Pensador, ‘Lôra burra’. “O machismo é atuante na sociedade brasileira, em todos os lugares que nós estamos. Na letra do rap, na presença dos homens, na língua brasileira. É muito difícil você encontrar um ambiente que não existe machismo. De todos os machismos que presenciei o do rap não foi o mais cruel”.

Thábata começou a carreira de rapper aos 14 anos quando conheceu um grupo de amigos que faziam rimas de improviso na cidade de Natal (RN). “Eu já tinha muita vontade de cantar, ouvia muita música e aí fiz o meu primeiro improviso. Foi como tirar a tampa de uma coisa que queria transbordar. A partir deste dia passei a compor muitas músicas, fiz parte dos meus primeiros grupos de rap e bandas”, explica.















 

 

 

 

 

 



 

“A música pode combater”

 

A cantora e compositora Elaine Dórea, de 30 anos, por sua vez, acredita que a música tem importância para reflexão social em todos os setores da sociedade, principalmente quando envolve as mulheres. “Eu acho que a música pode combater tudo. E nós como mulheres podemos usar a música em nosso favor. Não só mulheres, mas todas as pessoas que quiserem ajudar nessa causa tão importante”, complementa a cantora. Ao longo dos oito anos de carreira, nunca presenciou machismo no rap. “Até hoje, não. Frequento algumas batalhas no museu, e todas as vezes que vou é tranquilo”, afirma a rapper.


De acordo com a socióloga Márcia Guedes, as músicas com conteúdos machistas e depreciativas ainda estão presentes na mídia. Para ela não é algo distante da nossa realidade. “Infelizmente letras como ‘Amiga da minha mulher’ do cantor Seu Jorge e ‘Baile de Favela’ do MC João circulam até hoje”, lamenta Márcia. As duas letras citadas pela pesquisadora fariam alusão a assédio. Ela ainda completa que as mulheres estão cada vez mais se questionando sobre as letras. “É importante destacar que muitas mulheres engajadas na luta pela igualdade de gêneros se manifestam e repudiam publicamente esse tipo de expressão preconceituosa. As mulheres não reagem passivamente esse tipo de expressão”.

A repulsa à cultura machista está cada vez em discussão na sociedade, principalmente nas redes sociais. A socióloga opina que a música pode referendar a temperatura das discussões públicas.  reflete sobre sentimentos. “A letra é espelho da cultura machista, permite se referir às mulheres de maneira tão preconceituosa, como objeto. Há um consentimento social para esse tipo de declaração, com fortes traços patriarcais a mulher é propriedade, sobre a qual recai o poder masculino” afirma Márcia.

Por Beatriz Souza

25 anos depois de “Lôra burra”

A análise da reportagem concluiu que o gênero rap  é melódico e poético. As letras abordam o racismo e descriminação, mas apesar dessa característica, podemos encontrar nesse universo músicas que discriminam as mulheres. 

O produtor cultural Diogenes Barbosa explica como machismo e cultura não combinam. “É preciso perceber que o machismo incomoda as mulheres todos os dias. As vezes de forma velada, a depreciação na música contra as mulheres é muito presente e continua tendenciosa. Houve uma evolução, atualmente há uma forte reação de repúdio no cenário musical, contra esse tipo de preconceito”, avalia.

 

“Tem muita Lôra Burra de cabelo preto e castanho por aí. É…Lôra Burra morena, ruiva, preta”. Faz 25 anos que o cantor e compositor, o rapper Gabriel O Pensador lançou a música “Lôra Burra” e até hoje é alvo de críticas pelo teor machista da letra, lançado com um teor apelativo, traduzida em uma composição ofensiva, carregada de xingamentos e depreciações contra às mulheres.

 

Para a produtora musical brasiliense Sheila Campos, militante na Partida, um movimento feminista, a canção é falaciosa “O que rapper atacou de maneira tão violenta é produzido pela mesma sociedade que baliza ações desumanizadoras - machistas - como essa música. Caso fosse lançada hoje, certamente seria frontalmente criticada nas redes sociais, nos movimentos feministas, nas escolas e em todos os espaços aos quais mulheres esclarecidas tivessem acesso”.

 

Agressões

 

Se em 1993, tinha Lôra Burra, em 2013 uma das letras que causaram repúdio foi “Trepadeira”, composição do rapper Emicida, quando diz que mulher "biscate" deve tomar uma surra de espada-de-são-jorge. O cantor declarou em uma nota pública, na sua página oficial do Facebook. “Estamos falando de uma música, não quer dizer, obviamente, que represente a minha opinião sobre as mulheres de forma geral e que o tema machismo no rap é importantíssimo e deve ser debatido e combatido, assim como na sociedade como um todo”.

 

O rapper Lil Sales diz não aceitar de forma alguma o preconceito e a discriminação contra as mulheres. “A música que deprecia a mulher, seja em qualquer gênero... sou capaz de nem ouvi-la, pois quem a compõe não valorizam e nem respeitam as próprias mães”.

 

 

 

 

 

 

Objetificação

 

Já a radialista e arte educadora Nadja Dulci vê a questão do machismo de uma outra forma. Confira no vídeo abaixo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Especialistas

 

Para o antropólogo Carlos Potiara “O corpo da mulher pertence a elas, não é assunto público é privado.  A questão das mulheres provocarem os homens, isso é um absurdo, o que não pode acontecer é que as mulheres sejam depreciadas. Nos países europeus por exemplo não se praticam esse tipo de comportamento por uma questão de urbanidade, de cavalheirismo o que lamentavelmente não acontece no Brasil. Compositores de músicas machistas não tem urbanidade não percebem onde estão inseridos socialmente no processo civilizatório”, explica Potiara.

 

A socióloga Márcia Guedes explica que quando um artista compõe esse tipo de música está inserido em um contexto social, cultural, econômico e político como o nosso, marcado pelo preconceito contra as mulheres. Felizmente, movimentos feministas organizados se posicionam e combatem esse tipo comportamento social.

 

Com a palavra, elas

 

A administradora e chef de cozinha Camila Reuters, 23 anos, é loira e lamenta que até hoje, 25 anos depois da música de Gabriel, o Pensador, ainda existam comportamentos agressivos também na música. Ela explica que sempre ouve piadinhas a respeito das loiras, principalmente dos amigos. “Mas, levo tudo na brincadeira nunca me senti ofendida nem desrespeitada. Essa estória de loira burra, pra mim não passa de um mito. Lourice e burrice no meu caso, não combinam”.

 

A auxiliar de limpeza Francinete Lima, de 35 anos, que também é loira, diz que as ofensas partiram de dentro de casa. “Meu ex-marido me humilhava com agressões verbais que lembravam a cor do cabelo”.

 

Por Leonice Rezende

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